No quadro de um mercado de trabalho competitivo e em constante mutação, são cada vez mais os trabalhadores que procuram ingressar, ou reingressar, nos estudos por forma a fortalecer a sua posição no quadro da empresa onde prestam actividade.
Tendo presente esta moldura conjuntural e consciente do esforço que a mesma exige de um trabalhador, o legislador consagrou na lei um estatuto de protecção para trabalhador-estudante, cujo conteúdo muito resumidamente aqui apresentamos.
Enquadramento Legal
O regime jurídico do trabalhador-estudante encontra-se regulado nos artigos 89.º a 96.º do Código do Trabalho, consagrando um regime de especial protecção para os trabalhadores que reúnam as condições nele elencadas.
Noção
Nos termos da lei (artigo 89º do Código do Trabalho) será considerado trabalhador-estudante o trabalhador que frequente qualquer nível de educação escolar, bem como curso de pós-graduação, mestrado, doutoramento em instituição de ensino, ou ainda um curso de formação profissional ou programa de ocupação temporária de jovens que tenha uma duração igual ou superior a seis meses.
Condições para a obtenção do estatuto de Trabalhador-Estudante
A atribuição deste regime de protecção depende, desde logo, da comprovação feita pelo trabalhador, perante a entidade empregadora, da sua condição de estudante, bem como da apresentação do seu calendário escolar.
Procurando, de certa forma, proteger o empregador, que de outro modo se veria à mercê dos horários de estudo escolhidos pelo trabalhador, a lei impõe uma conduta de boa-fé por parte deste último na escolha do horário das respectivas actividades educativas.
Significa isto que, o trabalhador-estudante deverá procurar conciliar da melhor forma os estudos com o trabalho, escolhendo dentro das várias possibilidades existentes no seu estabelecimento de ensino o horário compatível com as suas obrigações profissionais.
Sublinhe-se, contudo, que esta imposição legal apenas se circunscreve a uma escolha de horários dentro do estabelecimento de ensino escolhido pelo trabalhador.
Direitos
O trabalhador-estudante goza de um conjunto de direitos e benefícios em relação aos demais trabalhadores, nomeadamente nas seguintes matérias:
- Horário de trabalho / Dispensa de trabalho;
- Trabalho suplementar;
- Justificação de faltas;
- Férias;
- Licenças.
(a) Horário de trabalho / Dispensa de trabalho
No que respeita ao horário de trabalho, o art. 90.º do Código do Trabalho, prevê a existência de um horário flexível, ajustado de modo a permitir a frequência das aulas e a deslocação para o estabelecimento de ensino.
Sempre que não seja possível atribuir ao trabalhador um horário de trabalho nos termos acima descritos, este terá direito, se assim o exigir o horário escolar, a dispensa de trabalho para frequência de aulas, sem que com isso lhe sejam subtraídos quaisquer direitos, contando esse período como prestação efectiva de trabalho.
A dispensa para frequência de aulas oscila entre três a seis horas semanais, dependendo do período normal de trabalho semanal:
• 3 horas para período igual ou superior a 20 horas semanais e inferior a 30 horas;
• 4 horas para período igual ou superior a 30 horas semanais e inferior a 34 horas;
• 5 horas para período igual ou superior a 34 horas semanais e inferior a 38 horas;
• 6 horas para período igual ou superior a 38 horas semanais.
(b) Trabalho Suplementar
No que concerne a realização de trabalho suplementar, à partida, o trabalhador-estudante estará exonerado desse dever, bem como da prestação de trabalho em regime de adaptabilidade, banco de horas ou, quando coincida com o horário escolar ou com prova de avaliação, em horário concentrado.
Ainda assim, na eventualidade de ocorrência de um motivo de força maior, poderá ser exigido ao trabalhador a prestação de trabalho num dos referidos modelos.
Nesta situação, caso o trabalhador tenha prestado trabalho suplementar terá direito a um descanso compensatório de igual número de horas. Nas restantes situações, o trabalhador beneficiará de um dia de dispensa por mês, sem perda de direitos, contando esse período como prestação efectiva de trabalho.
(c) Justificação de Faltas
O trabalhador-estudante tem, ainda, direito a ausentar-se justificadamente do trabalho para a prestação de provas de avaliação.
Efectivamente, o trabalhador poderá faltar até dois dias por cada prova de avaliação, sendo um o dia de realização da prova e o outro o imediatamente anterior (aqui incluindo dias de descanso semanal e feriados).
Na eventualidade da realização de provas em dias consecutivos ou de várias provas no mesmo dia, o trabalhador terá direito a tantos dias de ausência (que deverão reportar-se aos dias imediatamente anteriores ao exame) quanto o número de provas que prestar.
Note-se que o número de faltas dadas em razão de prestação de prova de avaliação, não poderá exceder os quatro dias por disciplina em cada ano lectivo.
O supra enunciado direito à justificação de faltas apenas pode ser exercido em 2 anos lectivos relativamente a cada disciplina.
Deverão ainda considerar-se justificadas as faltas dadas pelo trabalhador-estudante na estrita medida das deslocações necessárias para a prestação de provas de avaliação, sendo retribuídas até 10 faltas em cada ano lectivo, independentemente do número de disciplinas.
Saliente-se que, para efeitos de justificação de faltas, a lei considera prova de avaliação “o exame ou outra prova, escrita ou oral, ou a apresentação de trabalho, quando este o substitua ou complemente e desde que determine directa ou indirectamente o aproveitamento escolar”.
(d) Férias
As especificidades deste regime no direito a férias consistem no facto do trabalhador-estudante ter direito a marcar 15 dias de férias (a gozar de forma corrida ou interpolada) de acordo com as suas necessidades escolares.
Importa, contudo, notar que esta faculdade poderá não existir se daí resultar uma comprovada incompatibilidade com as exigências de bom funcionamento da empresa.
(e) Licenças
A somar aos 15 dias de férias supra referidos, o trabalhador-estudante terá, ainda, direito a uma licença sem retribuição durante 10 dias, que também poderá ser gozada de forma corrida ou interpolada.
Para beneficiar da licença sem retribuição, será necessário que o trabalhador a solicite com a antecedência de 48 horas, 8 dias ou 15 dias, consoante pretenda gozar de 1, 2 a 5 dias ou mais de 5 dias de licença, respectivamente.
Condições para a manutenção do estatuto de Trabalhador-Estudante
Sob pena de não beneficiar dos direitos inerentes ao estatuto em análise, o trabalhador-estudante tem que provar o seu aproveitamento escolar no ano lectivo anterior, ou seja, tem que transitar de ano ou pelo menos obter aprovação em metade das disciplinas em que esteja matriculado (ou com a aprovação ou validação de metade dos módulos ou unidades equivalentes de cada disciplina).
Nos termos da lei, será ainda considerado trabalhador-estudante com aproveitamento escolar, aquele que não tenha obtido a referida aprovação em razão de um acidente de trabalho ou doença profissional, doença prolongada ou que tenha beneficiado de (i) licença em situação de risco clínico durante a gravidez; (ii) licença parental inicial por um período superior a um mês; (iii) licença por adopção por um período superior a um mês; ou (iv) licença parental complementar por um período superior a um mês.
Cessação do Estatuto de Trabalhador-Estudante
A manutenção dos direitos a um horário ajustado, a dispensa de dias de trabalho para frequência de aulas, a marcação de dias de férias de acordo com as necessidades escolares ou o direito a beneficiar de um período de licença sem retribuição, dependem do aproveitamento escolar do trabalhador no ano em que o mesmo tenha beneficiado dos referidos direitos.
Com efeito, a falta de aproveitamento escolar (nos termos em que a lei o prevê) durante um ano lectivo determinará a perda dos direitos acima mencionados.
Já no que respeita aos demais direitos conferidos ao trabalhador-estudante, nomeadamente, a dispensa de prestação de trabalho suplementar e o especial regime de justificação de faltas, estes apenas cessarão quando o trabalhador não comprove o seu aproveitamento escolar durante dois anos consecutivos ou três interpolados.
Na eventualidade de o trabalhador, por algum motivo, vir a perder o estatuto de trabalhador-estudante, este apenas poderá voltar a beneficiar do mesmo no ano lectivo imediatamente a seguir àquele em que os direitos cessaram.
Todavia, sublinhe-se que a perda e subsequente renovação dos benefícios próprios do regime de protecção do trabalhador-estudante, não poderá ocorrer mais do que duas vezes.
Fonte: Sapo